quinta-feira, 11 de setembro de 2014

O Carlos

Kissinger, Mao e Chu ao fundo, para nós todos; mas Henry, Tsé-Tung e En-Lai ao fundo, para o Carlos. Intimidades geo-políticas...

Há um ano, vi na televisão um governante em mangas de camisa não arregaçadas, a cirandar num palco, qual Bill Gates ou outro qualquer que apresentasse um telefone made in Silicon Valley, com a importância que o governante não tem, e a botar faladura para uma plateia de jovens homúnculos. Do alto da sua ensaiada descontracção, de microfone pregado na gravata, conta à juventude ignara uma anedota de história diplomática dos anos setenta do século XX, protagonizada pelo antigo Primeiro-Ministro da República Popular da China, Chu En-Lai, e pelo antigo Secretário de Estado dos Estados Unidos, Henry Kissinger.

E não é que ao longo do humorístico relato, o governante orador se refere repetidamente ao número dois de Mao Tsé-Tung como "o En-Lai" para aqui, "o En-Lai" para ali, "o En-Lai" para cima e "o En-Lai" para baixo? Assim mesmo, num caloroso mas ignaro contributo para a irremediável deseducação das massas pequeno-burguesas, sentadas na aula da universidade de verão do psd, massas cada vez mais pequenas e cada vez menos burguesas devido ao implacável assalto fiscal do governo de que o governante fazia parte.

Pois é. Não que eu saiba mandarim, mas sei que quem decide cativar a plateia com a historieta que o governante escolheu para fazê-lo deveria saber que nos nomes em mandarim se escreve primeiro o apelido e depois o nome próprio. Daí "maoismo", e não "tsé-tunguismo", n'est-ce pas? Bastava perguntar ao Durão Barroso, que até já deve ter dado umas aulas na universidade de verão do psd.

A palestra do Carlos (tratamento que o palestrador certamente prefere e incentiva) resultou assim num insulto. Não um insulto ao psd, porque embora merecido jamais seria inteligível para o próprio partido. Sim um insulto à Universidade, mas, pensando bem, do qual não vem particular mal ao mundo. Acima de tudo, um insulto ao Verão, este sim, algo de intolerável, como reconhecerá o orador quando tiver de viver em Bruxelas. Já dizia o semi-divino Aníbal, num famoso artigo aqui há uns anos: a má moeda substitui a boa moeda. A menos que o ofensor faça uma correcção, não apenas monetária, mas nominal.

PS – Se o impante palestrador se desse ao trabalho de buscar alguma informação facilmente acessível três anos antes de palestrar, facilmente constataria que a sua anedota é espúria, pois que Chu En-Lai se referia ao Maio de 1968 e não à Revolução Francesa de 1789.

Sem comentários:

Enviar um comentário